domingo, 25 de julho de 2010

Geraldo Carvalho, candidato ao governo do Piauí pelo PSTU16, concede entrevista ao portal O DIA (www.sistemaodia.com.br) e detalha sua plataforma de campanha. Veja.

"Silvio, Wilson e JVC representam os mesmos interesses"

Foto: Elias Fontinele
Geraldo Carvalho (PSTU)

Sociólogo, professor da Universidade Federal do Piauí, Geraldo Carvalho teve toda sua vida liga ao trabalho público e à militância. Foi professor da rede estadual de ensino e presidiu o Sindicato dos Bancários do Piauí. Essa sua ligação com os movimentos sociais está diretamente ligada ao seu posicionamento político que defende há vários anos como líder do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU).

Geraldo Carvalho, candidato ao Governo do Estado, diz que o capitalismo dominante no mundo hoje gerou riquezas, mas não distribui para a população. Pior: não consegue resolver, na sua opinião, os problemas da fome, da pobreza e vida digna para o povo.

“Mais de 1 bilhão de pessoas no mundo passam fome hoje. O capitalismo não resolve isso”, critica o candidato. Para ele, o socialismo é a melhor forma de administrar as riquezas produzidas pelo homem. Sobre as eleições de 2010, Carvalho ressalta que os três candidatos ao Governo do Estado que mais estão à frente das pesquisas (Silvio Mendes, Wilson Martins e João Vicente Claudino) representam os mesmos interesses de classes. “E qualquer um dos três que ganhar, não tenha dúvidas que o programa será o mesmo. A prioridade será produzir a monocultura para exportação, pagar juros e serviços de uma dívida que já foi paga, que não existe mais e isso é apenas um mecanismo de manutenção da dependência do país, do Estado aos interesses do imperialismo”, critica.

Confira a entrevista com Geraldo Carvalho, como parte da série que o Sistema O DIA vem fazendo com os candidatos a governador e a senador.

O PSTU tem 30 anos de história e, durante esse tempo as bandeiras do partido continuam praticamente as mesmas. Os problemas do país não mudaram ou o partido não se atualizou?
Na verdade, o PSTU está completando 16 anos, agora em agosto, quando o partido foi institucionalizado. Antes disso, éramos uma corrente organizada dentro do Partido dos Trabalhadores. Mas o partido, exatamente, atuando como pessoa jurídica, vem de 1994.

Em relação às bandeiras, os problemas do país não mudaram ou o partido não se atualizou?
Essa é uma questão interessante. Como somos uma organização que defende o socialismo e o classismo, as pessoas sempre estranham, mas não está fora de uso. O fracasso das experiências socialistas, na União Soviética, Cuba, China e outras, respondemos sempre da seguinte forma: o velho é o capitalismo. O capitalismo tem 600 anos. A primeira experiência socialista tem 90 anos, que é a experiência da União Soviética. Portanto, é uma experiência muito recente. No capitalismo, nós reconhecemos a importância desse movimento. Reconhecemos as vantagens que esse movimento trouxe em relação à idade média, em relação à antiguidade. Mas o capitalismo hoje, se formos contabilizar seus benefícios para a humanidade, vamos verificar que estamos retrocedendo. O capitalismo não cumpriu com suas promessas básicas. A Revolução Francesa, que foi, digamos assim, a luta final da burguesia contra a nobreza, se formos ver as promessas da burguesia, a questão da saúde, da educação, ou seja, as promessas básicas não foram cumpridas. Nesses 600 anos de capitalismo, o que agente constata é isso: o capitalismo não cumpriu com suas promessas de solucionar problemas elementares da humanidade. Problema da fome, da inclusão, do acesso da humanidade aos bens produzidos pela própria humanidade. Por isso, nesse sentido, o socialismo é novo, porque hoje o capitalismo está em um processo bem avançado de destruição da natureza, da renda humana, e temos mais de 1 bilhão de pessoas que passam fome.

O senhor fala em capitalismo e socialismo. Como seria implantado o socialismo aqui em nosso Estado? Teria como implantá-lo, já que o capitalismo já está enraizado?
São medidas simples. Não temos a ilusão de que o socialismo pode ser implantado em um único Estado, em uma única nação e nem em um único país. O nosso debate é teórico, como o stalinismo do século passado. Foi justamente o Estado que defendia a tese do socialismo, e nós defendíamos a tese da revolução permanente, a necessidade de que o socialismo tinha que ser implementado no mundo inteiro. Dos anos 90 para cá o que nós temos visto no país sem tido uma política do focalismo. O desmonte do Estado, onde transformaram o Estado em uma máquina a serviço do capital e retirar do Estado as políticas públicas universais e deixar as políticas focalistas. Essas políticas não respondem às necessidades da população. Então nós vamos convergir em políticas públicas universais, de saúde, com a ampliação de postos de saúde, hospitais, contratação de pessoal, laboratórios, um sistema de saúde que possa atender as necessidades da população. Até a proposta do SUS. O SUS não fomos nós que criamos, não foram os socialistas. Todos sabem que o SUS não é cumprido, não atende a sua proposta inicial.

Qual seria a proposta do PSTU para essa distribuição de renda?
Reforma Agrária. Quando se fala da questão da geração de emprego, tem um modelo tradicional que é de atrair as empresas para os Estados. Isso virou uma guerra enorme entre empresas e Estados, com a guerra fiscal. Tem muita gente que se elegeu com esse discurso de atrair empresas para o Estado e isso não resolveu. Agora, mudaram a fórmula, o discurso. Estão adotando o discurso de expansão do agronegócio, através da produção de soja, cana-de-açúcar e do eucalipto. Essa política não vai resolver nosso problema. Ela vai criar mais problemas. Vejam: o perfil dos plantadores de soja no Piauí, 84% são pessoas que tem experiências em outros Estados, em outras regiões, saíram de lá porque as terras já não produzem mais, os bancos já não financiam mais porque já estão endividados. Então, essas pessoas vêm pra cá. Não gera emprego, porque as pesquisas mostram também. Tem uma pesquisa recente de geração de empregos nos cerrados, onde mais de 90% dos empregos gerados são empregos semi-escravos. Só 7% é emprego permanente. É uma atividade altamente mecanizada, portanto não gera emprego e a riqueza produzida não fica no nosso Estado, nem no país, vai para o exterior, porque a produção de monocultura tem esse destino, é o mercado externo.

Além dessas medidas que o senhor falou, há outras medidas no programa do PSTU como reutilização de salários, a reestatização de empresas privatizadas, e congelamento dos preços. Essas propostas são viáveis no contexto atual?
São necessárias. É claro que vamos ter dificuldade em implementá-las, mas é preciso que se faça um debate com a população, sobre o que é necessário fazer para resolver os problemas de fato, os problemas reais da população. A questão da redução da jornada de trabalho, isso é algo que a Europa já está fazendo. Por quê? O que foi que aconteceu? Com a tecnologia, nós temos emprego estrutural enorme. Isso significa que tem menos postos de trabalho porque as máquinas ocuparam boa parte dos postos de trabalho. Então, se tem menos postos de trabalho é preciso reduzir a quantidade de trabalho de cada pessoa. Cada pessoa trabalha menos para poder mais pessoas trabalharem. A Europa está fazendo isso. É essa a lógica da redução da carga horária de trabalho, sem redução de salário. Mas a lógica hoje está exatamente o contrário. Aumentou a jornada de trabalho das pessoas. Hoje, as pessoas trabalham 7, 8, 10 horas de trabalho por dia em um ritmo de trabalho mais acelerado. É preciso reduzir para que sobre mais trabalho para mais gente. Além da estatização, o controle. Não podemos deixar a população à mercê de um cárcere. O sistema financeiro, não só do Brasil, mas do mundo, nesse período de movimentação da economia, gerou uma especulação. Você observa a quantidade de financeiras, a quantidade de banco que abriu. Isso é especulação. Então, se você coloca a nação, o país, o Estado, à mercê, e subordina todo o resto, a vida das pessoas a essa lógica da especulação isso é terrível. Então, é preciso que o Estado tenha controle do sistema financeiro. E, nesse sentido, nós defendemos a estatização do sistema inanceiro, a reestatização das empresas privatizadas como o setor de energia, telefonia. Precisamos reestatizar isso para que o país possa se desenvolver, com autonomia, soberania, independência e se desenvolver não só do ponto de vista do lucro, mas do ponto de vista do social, das pessoas. É preciso se combinar esse desenvolvimento da riqueza com o desenvolvimento das pessoas, de forma mais igual.

O senhor criticou a política adotada pelos outros governantes de atrair grandes empresas. A guerra fiscal acabou sendo a forma encontrada pelos Estados para atrair as grandes empresas. Que alternativas o senhor vê para evitar essas isenções fiscais e ainda assim promover o desenvolvimento?
Nós precisamos compreender que a lógica de uma empresa quando vem pra cá, não é pensando no desenvolvimento social do Estado, não está pensando no desenvolvimento das pessoas do Estado. Está pensando na questão do lucro, se vai ter ou não. Então, mesmo na lógica do lucro, se ela vem pra cá, ela vai fazer um estudo de mercado e verificar se tem a possibilidade de ter lucro e definir se vem ou não. O que não pode é o Estado prescindir de suas receitas, dos impostos porque é beneficiar a empresa duas vezes.

Mas não se pode negar que geram emprego. Qual seria a alternativa então?
Eu já falei de uma medida que é a reforma política, que seria a principal. Em vez de se entrar na guerra fiscal, da expansão do agronegócio. Se não vamos tomar esse caminho, o nosso é fazer a reforma agrária e investir na agricultura familiar. Nós vamos produzir, em primeiro lugar, e isso gera emprego, produzir aquilo que a população precisa para se alimentar, arroz, feijão, verduras, frutas. Precisamos investir em infraestrutura? Precisamos! Precisamos melhorar as estradas? Precisamos! Mas isso não pode estar simplesmente vinculado ao desejo de uma ou outra empresa que venha a se instalar aqui. Tem que se conciliar os interesses da população, sobretudo da população trabalhadora que é quem mais precisa do Estado. Não venha me dizer que uma empresa, um banco precisa mais do Estado do que as pessoas que passam fome e as que não têm assistência a saúde, não tem escola...

O senhor e seu partido defendem a divisão da renda e uma política socialista que seria em contraponto ao capitalismo. Como é que há o diálogo do PSTU e suas propostas junto ao empresariado local e como o senhor faria uma proposta para o setor privado?
As empresas precisam compreender. Elas mesmas defendem, pregam a liberdade. A não intervenção do Estado na questão econômica. Então, como elas defendem isso e ao mesmo tempo querem subsídios, querem os recursos do Estado ao seu dispor? Querem a ajuda do Estado, querem crédito subsidiado, isenção fiscal? Os recursos do Estado são arrecadados pela população, e deve estar a serviço de política pública universais, como moradia, educação, saúde, segurança. É o direito. Então essas são as finalidades do Estado. O Estado não pode deixar de investir na escola pública, para favorecer a escola privada. Aí você vê o cenário: as escolas públicas com os índices, que o próprio Governo está mostrando, no caso do Piauí, o pior índice e você tem na outra ponta, as melhores escolas privadas. O Piauí tem três das melhores escolas particulares. É um exemplo concreto do que acontece quando o Estado deixa de investir na escola pública. Tem que fazer com que a escola pública funcione, tenha profissionais preparados, qualificados, que tenha recursos para laboratórios, didáticos, que possam atender a demanda com vagas suficientes para atender quem precisa. Então, quando o Estado deixa de investir na escola pública, as pessoas se sentem obrigadas a ir para a escola privada. Por que a pessoa não sai preparada para ocupar um espaço no mercado de trabalho. Na saúde, a situação é a mesma. Quando se vai em um hospital, da rede municipal ou estadual, não se consegue um atendimento, não tem médico, não tem material, não consegue consulta. Se vai pro privado, se tem dinheiro você é atendido. É o que eu critico, a política neoliberal do Estado de se dar o mínimo para as políticas públicas e o máximo para o capital. Abandona para obrigar as pessoas a se endividarem pagando planos de saúde, escolas privadas...

O PSTU sempre busca candidatura própria nas últimas eleições. Se o objetivo é a exposição das ideias, não seria mais estratégico, do ponto de vista político, buscar uma coligação entre os partidos pequenos que permitisse maior inserção no horário eleitoral?
É um mito isso. Como disse no começo, nós éramos um segmento do Partido dos Trabalhadores, quando o PT era realmente dos trabalhadores. Quando eles deixaram de ser da classe trabalhadora, nós saímos do PT e fundamos o nosso partido. Depois outros grupos, outras correntes saíram também do PT e fundaram outros partidos, o PSOL, por exemplo. E nós fizemos unidade em 2006: PCB, PSOL e PSTU, tanto para presidente quanto para governador. Fizemos também em 2008. Mas neste ano, não deu. Tivemos problemas circunstanciais, não houve acordo entre os partidos em determinados pontos, mas isso também não é problema. Tivemos realmente uma fragmentação da esquerda, não temos nenhuma vergonha de reconhecer isso publicamente. E a nossa tarefa é reorganizar, rearticular e da forma a esquerda e a classe trabalhadora porque é assim que nós vamos garantir vitórias. Na década de 80, com a criação da CUT, tivemos muitas vitórias e fomos perdendo e o PT acabou de entregar o restante dessas vitórias. Então, nós vamos recomeçar, reorganizar a esquerda socialista do Piauí e do Brasil.

Mudando esse posicionamento que o PT tinha, ele conseguiu chegar ao poder. Como o senhor interpreta essa postura do partido em relação ao quadro que ele se encontra hoje, totalmente diverso do que era antes?
Pois é, ele se rendeu. Lamentavelmente ele trocou as bandeiras da classe trabalhadora, o programa da classe trabalhadora, o objetivo estratégico da classe trabalhadora e da construção do socialismo, eles trocaram por um cargo de governador, de presidente, de deputado, de senador. Lamentavelmente trocaram.

O senhor já se candidatou em outros pleitos e sempre se deparou com essa polarização de partidos mais fortes. Como o senhor vê isso? É prejudicial?
É prejudicial e intencional. Na verdade, é um jogo que se tenta fazer no sentido de esconder as candidaturas críticas do sistema. E tentam polarizar para que o resultado das eleições fique sempre nas mesmas mãos. Se você pegar aqui no Piauí, o Silvio Mendes, Wilson Martins e o João Vicente, todos representam os mesmos interesses de classes. Eles não declaram isso. Muito pelo contrário. Nas suas campanhas, nas suas propagandas eles fazem um discurso para a classe trabalhadora, dizendo que vai resolver os seus problemas, que até desaparecem durante as campanhas eleitorais. Eles fazem até um discurso no sentido de encobrir as críticas que outros setores fazem a essa sociedade. E qualquer um dos três que ganhar, não tenha dúvidas que o programa será o mesmo. A prioridade será produzir a monocultura para exportação, pagar juros e serviços de uma dívida que já foi paga, que não existe mais e isso é apenas um mecanismo de manutenção da dependência do país, do Estado aos interesses do imperialismo. Vão continuar defendendo a expansão do agronegócio. Vão continuar defendendo não recursos para a Uespi, que é um caso gritante no Estado. A nossa constituição estabelece que o governo deve investir, no mínimo, 30% da corrente líquida na educação. Primeiro: o Estado não cumpre isso. Investe 25% ou menos. Segundo: a Uespi vive como um escolão, que não tem autonomia financeira, que vive das emendas parlamentares de um e outro. O servidor da instituição é o único segmento do funcionalismo público que não tem planos de carreira e as condições de ensino, extensão e pesquisa não existem. 60% do quadro de professores é substituto. A manutenção dessa política será feita por qualquer um dos três. Nenhum diz de onde vão tirar os recursos para melhorar a saúde pública, a moradia. Ficam todos dependendo do Governo Federal porque a maior parte dos recursos estaduais é para o funcionamento da máquina, muito ineficiente e a outra parte para pagar a dívida e a especulação financeira.

Autor/Fonte: Elizângela Carvalho/Nildene Mineiro/Cícero Portela | Edição: Tamires Coelho